quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

REFLEXÕES E APONTAMENTOS SOBRE O PROJETO ELITISTA DE URBANIZAÇÃO DO CENTRO DE NITERÓI


O desenhista de quadrinhos norte-americano Will Eisner construiu boa parte da sua obra afirmando a relação que as pessoas comuns têm com as suas cidades.As pessoas invisíveis, como ele designou, passavam a ter relações afetivas com os espaços arquitetônicos onde cresceram. É famosa uma hq intitulada "Edifício", onde Eisner percorre as histórias de vários personagens e as suas mais diversas relações com aquele prédio. Pois bem, o que Niterói tem a ver com isso? A cidade está passando pela discussão acerca de uma suposta revitalização de seu centro, proposta pela Prefeitura.Porém, o que poderia representar uma boa nova, esconde na verdade um projeto cruel de beneficiamento do setor das empreiteiras. A cidade sofre há pelo menos uma década com os impactos da especulação imobiliária e o crescimento desordenado que acompanhou a subida brusca dos preços dos imóveis.Antes a sanha dos investidores, como a multinacional Brasil Brokers, se resumia às areas ditas mais "nobres" do município.Ficou famoso o surgimento de um novo bairro, Jardim Icaraí, que nada mais é que um golpe publicitário para valorizar a área sempre conhecida como parte do bairro de Santa Rosa.Outros casos emblemáticos podem ser citados, como um hospital e um condomínio claramente instalados no centro que foram batizados com o mesmo nome do tradicional bairro da zona sul.Agora que essas regiões se mostram estranguladas em seu crescimento vertical, os tentáculos da especulação se lançam em direção à zona norte,mais precisamente ao centro antigo, que sempre fora abandonado pelo poder público.Os movimentos em defesa do direito à moradia, constitucional por sinal, sempre reivindicaram a possibilidade dos trabalhadores poderem residir nos centros urbanos, mais próximos aos seus locais de trabalho.Contudo,a proposta do poder executivo, contempla na verdade o grande capital, vetando inclusive tentativas feitas pela oposição na Câmara Municipal de que construções populares fossem priorizadas. Falo da questão como profundo conhecedor, pois moro no centro de Niterói há mais de 20 anos e a redação desse texto foi motivada por um caminhada que me vi obrigado a fazer.Após deixar o carro na oficina, resolvi usar as canelas para fazer o percurso até a casa da minha mãe.O que pude notar foi uma mudança drástica, com o fechamento de lojas tradicionais que acompanharam minha infância, pois é comum o aumento de aluguel em áreas que passam por esse processo analisado.Outro aspecto que pude observar foi a subida de condominíos residenciais de enormes blocos, onde famílias populares não vão colocar os pés, afinal pequenos apartamentos ali não saem por menos de R$ 350.000,valor distante fos orçamentos de famílias mais pauperizadas.Para completar, encontro uma amiga de longa data com sua filhinha.Ela me mostra a formosa casa de vila em que está morando, com seu filtro de sonhos na varanda.Mas como boa geógrafa que é, já vai me advertindo que vai ser expulsa dali pela gentrificação, que é o processo de expulsão dos pobres de áreas recém-valorizadas.Me conta que o valor de seu aluguel irá ser triplicado.Somos interrompidos por uma pedinte com um bebê que clama por uma esmola.Minha amiga busca uma lata de leite para a criança.Saio dali convencido de que o novo centro da cidade não é para essas pessoas e os seus sonhos vão ficar cada vez mais distantes.

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